Alessandra Korap Munduruku, 39 anos, liderança indígena da região da Bacia do Rio Tapajós, foi premiada no Goldman Environmental de 2023, considerado o mais importante para ativistas ambientais.
A cerimônia de premiação foi realizada na segunda-feira, 24 de abril.
Alvo constante de ameaças e ataques por sua luta – em 2019 e 2021 ela teve sua casa em Santarém (PA) invadida – Alessandra frequentemente afirma em entrevistas que seu povo resiste “para continuar vivo”.
“É um reconhecimento da luta de todo o meu povo, de todas as mulheres que não conseguiram chegar até aqui. Não quero ser vista e ouvida depois que eu estiver morta. Dorothy Stang e Chico Mendes morreram nesta luta. Quero ser vista agora, neste momento, nesta existência”, disse Alessandra Munduruku à Deutsche Welle, dias antes de receber o prêmio, em São Francisco, Estados Unidos.
Alessandra Munduruku, que atualmente estuda Direito na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), foi a primeira mulher a presidir a Associação Indígena Pariri, que representa mais de dez aldeias do Médio Tapajós.
Em 2019, chegou a discursar para mais de 270 mil pessoas no Portão de Brandenburgo, em Berlim, e recebeu, em 2020, o Prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos.
Alessandra Munduruku foi escolhida para a premiação por sua dedicação e liderança na luta do povo Munduruku pela defesa de seu território contra o garimpo ilegal, em especial pela campanha contra a atuação da empresa britânica de mineração Anglo American, que pretendia extrair cobre no território indígena Sawré Muybu, no Pará.
Devido à pressão, a corporação se comprometeu, em maio de 2021, a formalmente retirar os 27 pedidos de pesquisa feitos à Agência Nacional de Mineração (ANM). Desses, 13 impactavam diretamente o território dos Munduruku.
O interflúvio Tapajós-Teles Pires é o território tradicional dos Munduruku, que hoje somam aproximadamente 14 mil pessoas e se encontram nas TIs Kayabi, Munduruku, Sai Cinza, Sawre Muybu e Sawre Bapim, além das reservas Praia do Mangue e Praia do Índio.
Mas nem todos esses territórios estão demarcados: a TI Sawre Muybu, ainda sem portaria declaratória, teve o seu processo de regularização fundiária interrompido por conflitos em torno do Complexo Hidrelétrico do Tapajós e, posteriormente, pela edição do Parecer 001 da AGU. A TI Sawre Ba’pim ainda está em processo de identificação — que tem corrido sob intensa pressão de interesses locais contrários.
Há, ainda, diversas ameaças aos territórios dos Munduruku. Entre os projetos de infraestrutura aos quais os indígenas têm resistido, destaca-se o corredor logístico Xingu-Tapajós, que conta já com diversas Estações de Transbordo de Carga (ETCs) em Miritituba (PA), e ainda prevê a construção da Ferrogrão, ferrovia de quase 1000 km de extensão que atravessa o Pará.
No que diz respeito às invasões, vale lembrar que as TIs Munduruku e Sai Cinza têm figurado, desde 2020, entre as mais desmatadas pelo garimpo ilegal, segundo o Mapbiomas. Essa atividade predatória tem provocado altos índices de contaminação por mercúrio, conforme comprovam estudos recentes da Fiocruz. As consequências para a saúde das pessoas são drásticas, especialmente crianças.
“Eu não queria ficar viajando. Eu queria ficar com meus filhos, cuidar da roça, banhar no rio, brincar, pescar. Não posso mais fazer nada disso. Isso dói. Mas, eu não vou desistir, eu vou estudar e lutar pelo meu povo contra o retrocesso, não posso me calar vendo o homem branco destruir a terra dos meus filhos. Ver outros povos sofrendo também, crianças sendo abusadas, como as Yanomami. Defender o território é defender a vida”, frisou Alessandra Munduruku em encontro em maio de 2022, no Rio Negro.
Recentemente, ela e outras lideranças dos povos Yanomami e Kayapó lançaram um dossiê com um panorama do avanço do garimpo ilegal nos territórios desses três povos, considerados os mais afetados pela atividade ilícita.
Criada em dezembro de 2021, a Aliança em Defesa dos Territórios, articulação política dos povos Yanomami, Munduruku e Kayapó, atua conjuntamente contra o garimpo e outras atividades que destroem as Terras Indígenas onde vivem.
Premiação
Alessandra Munduruku é a quarta brasileira a ser homenageada com o prêmio na categoria América do Sul e Central. Em 2006, o ambientalista Tarcísio Feitosa recebeu o prêmio por sua trajetória em defesa da região do Xingu e da Terra do Meio, no Pará.
Em 1996, a ministra do Meio Ambiente Marina Silva foi reconhecida por sua atuação na criação das Reservas Extrativistas no Acre.
O primeiro brasileiro a ser premiado com o prêmio Goldman foi um dos fundadores do Instituto Socioambiental (ISA), Beto Ricardo, em 1992, por sua atuação na garantia dos direitos dos povos indígenas.
* Por Equipe ISA. Com informações da Deutsche Welle, g1 e BBC Brasil.