SÃO PAULO (Reuters) – Filme de abertura, fora de competição, no Festival de Cannes 2015, o drama “De Cabeça Erguida”, de Emmanuelle Bercot, aposta no peso da grande estrela Catherine Deneuve para chamar a atenção sobre um drama que discute um tema árido e recorrente – os menores infratores, questão candente na França e ainda mais no Brasil.
Assumindo uma vocação humanista, o roteiro, assinado pela diretora com Marcia Romano, segue os esforços de uma juíza, Florence Blaque (Catherine Deneuve), e um assistente social, Yann (Benoît Magimel), para dar novas chances a um adolescente aparentemente incorrigível, Malony (o estreante Rod Paradot).
Atriz experiente (premiada em Cannes 2015 pelo ainda inédito “Mon Roi”) e diretora voltada a dramas intimistas (como “Ela Vai”, com a mesma Catherine Deneuve) Emmanuelle Bercot focaliza este tema social a partir de uma opção por não sair demais de sua zona de conforto. Ou seja, o melodrama prevalece sobre a investigação sócio-política, o que é bom e ruim.
A escolha mostra-se positiva quando se salienta o aspecto emocional/afetivo destroçado do garoto, uma trajetória que o conduz a esse ódio sem freios que ele volta inclusive contra si mesmo e o encaminha ao mundo do crime. O enfoque também se mostra apropriado para enfatizar sua relação ambígua com a mãe irresponsável (Sara Forestier), frágil ela também – e uma personagem que o roteiro poderia ter construído melhor.
A narrativa igualmente se ressente de um melhor desenvolvimento de outro núcleo, incluindo uma professora de Malony e sua filha, Tess (Diane Rouxel) – que só parece ter entrado na história um pouco à força, para constituir um interesse romântico do protagonista.
O melhor da obra, em todo caso, está nas atitudes da juíza e do assistente social (que teve ele mesmo um passado semelhante ao de Malony). A adesão destes dois ao menino, ainda que muitas vezes ele não corresponda, resumem uma tomada de posição do filme, que é humanista, não policial. Num tempo em que muitos demonstram ter desistido de procurar uma estratégia minimamente vinculada a algum grau de civilização frente a adolescentes infratores, “De Cabeça Erguida” é um bem-vindo contraponto.
Promovendo este tipo de reflexão oportuna, “De Cabeça Erguida”, no entanto, não é grande cinema. Em força, originalidade, contundência e economia narrativa, fica anos-luz distante da produção belga “O Filho”, dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne, premiado em Cannes 2002. Em todo caso, o filme de Bercot tem sua importância e valor, especialmente pela dedicação de seus atores. Também não deixa de ser um comentário sobre a tolerância – afinal, quantas chances se deve dar a um juveníssimo infrator menor de idade? Numa época em que se decide reduzir a maioridade penal, dentro de uma ótica autoritária, o filme também chega ao Brasil em boa hora.
*Por Neusa Barbosa, do Cineweb
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Fonte: Reuters