Em 25 anos, é possível que os agricultores dos perímetros irrigados do Rio Jaguaribe, no Ceará, precisem de aproximadamente 9% a mais de água de irrigação para produzir a mesma quantidade de alimentos produzida hoje. Isso é o que aponta estudo da Embrapa que projetou o efeito das mudanças climáticas para a região nos próximos anos. Segundo o trabalho, a demanda por água de irrigação deve crescer em decorrência do aumento de 3% na evapotranspiração das plantas associado à redução de até 37% do volume de chuvas em relação à climatologia do período de 1961 a 1990.
O trabalho avaliou os impactos das mudanças climáticas na necessidade hídrica das culturas irrigadas na bacia do Rio Jaguaribe, no Estado do Ceará, considerando a variedade das culturas irrigadas, a eficiência dos sistemas de irrigação adotados e os cenários de mudanças climáticas. A bacia do Rio Jaguaribe contempla três perímetros irrigados: Tabuleiro de Russas, Jaguaribe-Apodi e Morada Nova. A pesquisa avaliou o padrão de cultivo mensal, sendo a maior parte da área ocupada com arroz, banana, feijão, milho, pastagens, dentre outras. Todos os sistemas adotados foram considerados: sulcos, inundação, aspersão, pivô central, microsaspersão e gotejamento.
“As mudanças climáticas são a nova pressão de demanda por água”, diz o pesquisador da Embrapa Agroindústria Tropical (CE) Rubens Sonsol Gondim, autor do trabalho. O estudo, que envolveu três centros de pesquisa da Embrapa (Agroindústria Tropical, Informática Agropecuária e Meio Ambiente), abrangeu uma área de 6,4 mil km² situada em um trecho de 160 km do Rio Jaguaribe. A região incluiu os municípios de Alto Santo, São João do Jaguaribe, Tabuleiro do Norte, Limoeiro do Norte, Quixeré, Jaguaruana, Russas e Itaiçaba.
Gondim diz que o estudo pode contribuir para a gestão racional da água, de forma a atender melhor os usuários. “É importante garantir a sustentabilidade dos recursos hídricos para manter a vocação de produção de frutas da região. Isso é um desafio para o setor produtivo”, diz o pesquisador.
Ele ressalta que o estudo levou em consideração as condições atuais de exploração da área e que a melhoria na operacionalização dos equipamentos pode tornar os sistemas de irrigação mais eficientes. Para mitigar o problema, o pesquisador recomenda que, além da melhoria na operacionalização dos sistemas, é necessária a utilização de dados climáticos para melhor aproveitamento dos recursos hídricos.
Além disso, segundo ele, os produtores podem se beneficiar de estratégias de manejo de solo, como a aplicação de hidrogel (polímeros hidroabsorventes obtidos do amido ou derivados do petróleo), mulching (cobertura morta ou manta plástica branca), biocarvão, plantio direto, dentre outros. “Algumas dessas soluções já são conhecidas e estão disponíveis. Há também muitas pesquisas que devem auxiliar os produtores a enfrentar as condições adversas que se apresentam,” conta o especialista.
Gondim lembra que a região estudada apresenta vulnerabilidades por ser bastante populosa e estar no semiárido. Mesmo assim, o pesquisador lembra que o Estado do Ceará tem demonstrado, nos últimos anos, bons exemplos de gestão de recursos hídricos. “O Ceará foi o primeiro estado do Nordeste a criar uma lei de uso dos recursos hídricos e apresenta condições geográficas favoráveis para esse gerenciamento, porque todos os rios que o cruzam, com exceção do Parnaíba, nascem e têm sua foz no estado”, diz Sonsol.
IPCC
A pesquisa realizada pela Embrapa sobre o impacto das mudanças climáticas na demanda de água para irrigação na bacia do Rio Jaguaribe é uma das referências citadas no V Relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). Estudos com oito bacias hidrográficas do Nordeste brasileiro foram citados no relatório. O documento é escrito por mais de 800 cientistas de 80 países, que avaliam mais de 30 mil artigos científicos. O V Relatório de Avaliação diz a políticos o que a comunidade científica sabe sobre a base científica das mudanças climáticas, seus impactos e riscos futuros, e opções para adaptação e mitigação.
O IPCC foi criado em 1988 pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP) e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM). É considerado o principal organismo internacional para a avaliação das alterações climáticas, com a missão de fornecer ao mundo uma visão científica clara sobre o estado atual do conhecimento da mudança do clima e seus potenciais impactos ambientais e socioeconômicos. O Relatório de Síntese e os materiais de apoio podem ser encontrados no site do IPCC.
Rede AgroHidro
O estudo realizado pela Embrapa sobre o impacto das mudanças climáticas na demanda de água para irrigação é um exemplo de pesquisas em andamento na rede AgroHidro, formada por 45 pesquisadores de 12 centros de pesquisa da Embrapa e oito universidades brasileiras. O objetivo da rede é avançar no conhecimento sobre como as mudanças no clima, no uso e na cobertura da terra já afetam ou têm potencial para impactar os recursos hídricos nos diferentes biomas brasileiros e seus efeitos na sustentabilidade ambiental e econômica das comunidades rurais.
O objetivo principal da rede é contribuir para a interação entre profissionais e instituições nacionais e estrangeiras na busca de soluções voltadas à sustentabilidade nas relações entre os recursos hídricos e as cadeias produtivas agropecuárias e florestais e à melhoria da qualidade de vida dos produtores rurais e da população em geral, promovendo o avanço do conhecimento e das tecnologias para o uso eficiente da água.
Mais informações no site da rede AgroHidro.
Fonte: Embrapa