Um grupo de líderes Kayapó foi recebido nesta quarta-feira (04) pelos presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (ambos do PMDB) em Brasília. A mensagem dos índios foi clara. Para eles, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 – aprovada em Comissão Especial, na semana passada – poderá agravar no país os conflitos de terra envolvendo os povos indígenas.
A proposta transfere do poder Executivo para o parlamento a última palavra sobre a definição dos limites de Terras Indígenas, Unidades de Conservação e quilombos. A PEC, que tem ampla adesão da bancada ruralista, também permite empreendimentos econômicos – mineração, por exemplo – dentro das Terras Indígenas.
Os Kayapó tiveram papel de destaque na Assembleia Nacional Constituinte – que gerou a atual Constituição brasileira, em 1988. Hoje, eles se consideram “traídos” pelos brancos, que querem tirar deles direitos assegurados na Carta Magna.
O primeiro encontro do dia foi na presidência do Senado. Segundo o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Cleber Buzatto, que participou do encontro, Calheiros disse que dificilmente a PEC será aprovada no Senado. “A proposta apenas transfere problemas do Executivo para o Congresso”, disse Renan.
Em maio deste ano, mais da metade dos senadores – 48 na última contagem – assinou um documento em que se posicionavam contrários à PEC 215. A expectativa é que os signatários mantenham essa posição, conquistando inclusive novos adeptos contra a proposta.
Os senadores signatários entendem que, se aprovada, a PEC irá paralisar definitivamente os processos de regularização das áreas protegidas fundamentais ao equilíbrio climático e à manutenção dos mananciais de águas e outros serviços ambientais.
Atualmente, existem cerca de 1.600 processos de regularização de áreas protegidas em processo de análise no poder Executivo, distribuídos entre a Fundação Nacional do Índio (Funai); Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio). Esses processos iriam automaticamente para o Congresso, que passaria a exercer funções que não são próprias do poder Legislativo.
Além disso, muitos processos de criação de áreas protegidas estão sendo questionados na Justiça, e em última instância, caberia ao Supremo Tribunal Federal (STF) julgar as causas, causando ainda maior confusão nos papéis entre os poderes da República.
A PEC 215 também é considerada pelos especialistas como inconstitucional, pois ela afeta – e reduz – direitos fundamentais de indígenas, extrativistas e quilombolas, garantidos no texto da Carta Magna.
Rito
Antes de desembarcar no Senado, porém, a PEC 215 ainda tem de cumprir certos ritos na Câmara dos Deputados. Como a proposta teve aprovação em uma Comissão Especial criada para analisar o assunto, o próximo passo é a votação em plenário. Para passar, será preciso ser aprovada em dois turnos – e isso valeria também para o Senado.
A demanda dos indígenas na reunião de hoje com Eduardo Cunha foi de que o presidente da Câmara usasse seu poder para evitar que a PEC fosse aprovada. O deputado simplesmente disse que isso não dependia “somente dele”, indicando que a PEC seguirá seu curso.
A única garantia que Eduardo Cunha deu aos Kayapó é que os indígenas terão acesso livre nas dependências da Câmara a partir de amanhã para que eles possam falar com os líderes dos partidos. A decisão chega um pouco tarde. Em dezembro passado, a polícia da casa chegou a impedir a entrada de indígenas que queriam protestar contra a PEC 215. O conflito gerou tumulto e agressões aos indígenas.
*Por Jaime Gesisky
Fonte: WWF Brasil